D. Dinis: O Rei Trovador
- Catarina
- 23 de set. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 26 de nov. de 2024
D. Dinis, o primeiro rei português a saber ler e escrever, compôs várias canções trovadorescas de amor, amigo e escárnio e maldizer
D. Dinis, o sexto rei de Portugal, é amplamente conhecido não apenas pela sua habilidade em governar, mas também por ser um dos mais ilustres poetas da nossa história. Ele foi o primeiro rei português a saber ler e escrever, o que era uma raridade entre os monarcas da época. Mas mais do que isso, D. Dinis destacou-se no universo da literatura medieval, compondo várias canções trovadorescas, que revelavam um talento artístico singular.

Filho de Afonso III e de Beatriz de Castela, cedo começou a ser preparado para suceder a seu pai assumindo responsabilidades de governação em parte devido à frágil saúde do rei. Afonso III morreu em 1279, D. Dinis foi aclamado em Lisboa, a 16 de fevereiro desse ano. Tinha dezoito anos, foi o sexto rei de Portugal.
Nascimento: 9 de outubro de 1261, Lisboa
Falecimento: 7 de janeiro de 1325, Santarém
Filhos: Afonso IV de Portugal, Pedro Afonso, conde de Barcelos, Ver mais aqui
Local de enterro: Convento de S. Dinis, Odivelas
Cônjuge: Isabel de Aragão (de 1288 a 1325)
Pais: Afonso III de Portugal, Beatriz de Castela
D. Dinis, que teve um dos reinados mais longos e importantes da História de Portugal. Nasceu em 1261, antes do casamento dos seus pais ser reconhecido pela Santa Sé. O facto que levou o seu irmão mais novo D. Afonso, nascido já depois desse reconhecimento, a contestar o seu direito ao trono, o que originou vários confrontos entre ambos. Este foi um dos confrontos que o rei teve com o poder senhorial e com parentes próximos.
Esses poemas ou canções, chamadas de "cantigas", dividem-se em três tipos principais: as cantigas de amor, as cantigas de amigo e as cantigas de escárnio e maldizer.
Nas cantigas de amor, D. Dinis expressava os sentimentos de um homem apaixonado, sempre enaltecendo uma dama inatingível, refletindo a tradição cortês. As cantigas de amigo, por outro lado, traziam uma perspectiva diferente, sendo cantadas na voz de uma mulher que lamentava a ausência ou infidelidade do amado. Essas obras capturavam as emoções e angústias das relações amorosas medievais.
Já as cantigas de escárnio e maldizer mostravam o lado satírico e crítico do rei. Usando ironia, sarcasmo e até humor mordaz, D. Dinis não poupava suas críticas à sociedade da época, ridicularizando costumes, comportamentos e até figuras públicas.
A poesia trovadoresca de D. Dinis revelou o lado mais humano de um rei conhecido por suas políticas de desenvolvimento agrícola e de preservação do território português. Combinando sua habilidade literária com seu papel de estadista, D. Dinis construiu um legado que ecoa até os dias de hoje, sendo lembrado como o Rei Trovador, que equilibrou o poder da coroa com a sensibilidade artística.
A produção poética do monarca não apenas enriqueceu a cultura literária de Portugal, mas também estabeleceu as bases para o florescimento do idioma português como língua de expressão artística. Por isso, até hoje, D. Dinis permanece como um dos símbolos da ligação entre cultura e poder em Portugal.
O Conflito entre D. Dinis e D. Afonso
D. Afonso, o irmão mais novo de D. Dinis, foi uma figura central em um dos conflitos mais tensos da história da monarquia portuguesa. O relacionamento entre os dois irmãos passou de uma convivência relativamente pacífica para um confronto direto, envolvendo disputas por poder e sucessão.
A partir de 1314, teve de enfrentar a rebelião de outro D. Afonso, deste vez de seu filho e herdeiro do trono. D. Afonso Sanches, filho ilegítimo de D. Dinis com Aldonça Rodrigues de Telha, foi uma das figuras mais próximas do rei durante boa parte da sua vida. Como era comum na época, os filhos ilegítimos, ou "bastardos", recebiam terras, títulos e privilégios. D. Afonso Sanches tornou-se um dos conselheiros mais próximos de D. Dinis e foi investido com diversas responsabilidades, entre elas a administração de importantes propriedades e cargos governamentais.
A disputa foi uma autêntica guerra civil, que só terminou definitivamente com a morte de D. Dinis, em 1325. Para a História deste confronto ficou a intervenção da Rainha Isabel de Aragão, a Rainha Santa, que conseguiu que pai e filho assinassem a paz em 1324. Dom Dinis terá sido o primeiro rei português a receber uma educação erudita, a saber ler e escrever. Compôs várias canções trovadorescas, impôs o galaico-português como língua dos documentos oficiais e trouxe para Lisboa os Estudos Gerais, ou Universidade, depois transferidos para Coimbra. Tal só foi possível porque, em 1290, foi assinada a concordata com a Santa Sé que pôs fim ao interdito a que Portugal estava sujeito desde 1267.
No entanto, essa proximidade com o monarca e a grande influência de Afonso na corte geraram atritos com o filho legítimo e herdeiro natural de D. Dinis, o infante D. Afonso, que mais tarde seria coroado como D. Afonso IV. O jovem príncipe começou a perceber que o favoritismo do rei em relação ao seu irmão bastardo ameaçava sua própria posição como sucessor. A ideia de que D. Dinis poderia estar preparando Afonso Sanches para assumir o trono — embora improvável do ponto de vista legal — circulava entre a nobreza e alimentava tensões.
Essa rivalidade culminou em um conflito aberto entre pai e filho. O infante D. Afonso, temendo perder sua herança e lugar de direito, organizou uma série de revoltas contra o seu pai. A rebelião eclodiu em 1319, com D. Afonso mobilizando aliados dentro do reino para confrontar as decisões de D. Dinis e, em especial, o poder de Afonso Sanches. O confronto chegou a tal ponto que Portugal se viu à beira de uma guerra civil.
D. Dinis, tentando pacificar a situação, usou sua habilidade diplomática para negociar uma solução. No entanto, o conflito prolongou-se até quase o final de seu reinado, exigindo mediação externa. A intervenção da rainha Isabel de Aragão, conhecida mais tarde como a Rainha Santa Isabel pela sua dedicação à paz e à mediação de conflitos, foi crucial para resolver a disputa. Ela conseguiu persuadir o marido e o filho a entrarem em acordo.
A Resolução e as Consequências
A paz foi selada em 1322, quando D. Dinis aceitou restabelecer D. Afonso como legítimo herdeiro do trono, e D. Afonso Sanches foi exilado, retirando-se para Castela. D. Dinis morreu em 1325, e D. Afonso IV finalmente subiu ao trono. Embora o conflito tenha sido resolvido, as cicatrizes dessa disputa familiar permaneceram, e D. Afonso IV jamais confiou totalmente no meio-irmão, mantendo-o distante da corte.
A rivalidade entre os dois teve profundas implicações políticas. Por um lado, mostrou o peso que os filhos ilegítimos poderiam ter nas dinastias medievais, muitas vezes causando divisões nas famílias reais. Por outro lado, destacou a importância da diplomacia e da mediação, com figuras como a Rainha Santa Isabel exercendo um papel vital na preservação da paz interna do reino.
O Legado de D. Afonso IV

Quando D. Afonso IV subiu ao trono, foi marcado pela memória desse conflito. Seu reinado foi, em muitos aspectos, uma tentativa de consolidar a autoridade real e evitar novas divisões internas. Ele ficou conhecido por seu papel na Batalha do Salado (1340) e pela continuidade de algumas das políticas de seu pai, mas o episódio com Afonso Sanches revelou a fragilidade das relações familiares no poder.
Em resumo, a disputa entre D. Dinis e seu filho legítimo D. Afonso IV, agravada pela figura de Afonso Sanches, exemplifica as complexidades do jogo de poder medieval, onde as questões de sucessão e favoritismo familiar podiam facilmente explodir em conflitos de grande escala.
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